Em Porto Alegre (RS), debate sobre o Pampa encerra o ciclo de plenárias do Plano Clima Participativo

Foto: Joca Moura/SECOM-PR

Representantes do Governo Federal estiveram nesta segunda-feira, 16 de setembro, no auditório da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre, para ouvir especialistas em meio ambiente, organizações da sociedade civil, conselhos de políticas públicas, movimentos sociais e sindicais, sobre como proteger o Pampa, durante a oitava e última plenária para debater o Plano Clima Participativo.

“Nós estamos trabalhando em sete planos setoriais de mitigação desses efeitos dos setores que mais emitem gases de efeito estufa. Estamos trabalhando em conjunto com os ministérios para que a gente desenvolva planos específicos, para que cada um desses setores possa diminuir a poluição que estão levando para a atmosfera”

Ana Toni
Secretária Nacional de Mudança do Clima, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima
As reuniões tiveram o intuito de engajar a sociedade civil no envio de propostas, tirar dúvidas sobre o processo e informar sobre as etapas da elaboração da estratégia que vai guiar a política climática do país até 2035.

O lançamento do ciclo de plenárias foi em Brasília, no dia 30 de julho. A partir daí, outros sete encontros presenciais foram realizados. Em 1° de agosto, o tema do ciclo foi o Sistema Costeiro-Marinho, em Recife (PE); no dia seguinte, a plenária abordou a Caatinga, em Teresina (PI); o Pantanal foi o tema da plenária de Campo Grande (MS), no dia 14; já o bioma Mata Atlântica foi debatido em São Paulo (dia 15); o Cerrado, em Imperatriz (MA), no dia 23 de agosto; a Amazônia, em Santarém, no dia 5 de setembro; e o Pampa.

Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Pampa é considerado o segundo bioma brasileiro mais devastado, com cerca de 60% da vegetação nativa desmatada. Perde apenas para a Mata Atlântica nesse triste quesito.

“Para surpresa de zero cientistas climáticos, exatamente um ano atrás choveu no Rio Grande do Sul. Para surpresa de zero cientistas climáticos, em novembro do ano passado choveu no Rio Grande do Sul. Para surpresa de zero cientistas climáticos, em maio deste ano choveu muito no Rio Grande do Sul. E aí vocês vão me dizer: ‘Que gente cruel esses cientistas climáticos que não nos contaram que esses desastres iriam acontecer.’ Mas nós contamos. Porque o próximo evento, alerto vocês, não será chuva, será seca. Porque o Pacífico vai esfriar, isso vai fazer esse monte de umidade passar para cá e nós vamos ter seca no Estado do Rio Grande do Sul. Escrevam isso.”

O cenário é descrito pela professora Marcia Barbosa, reitora da UFRGS e membro titular da Academia Brasileira de Ciência, da Academia Mundial de Ciência, e foi dito durante a plenária sobre o Pampa. O alerta da pesquisadora acende o sinal vermelho para debater medidas de preservação e de elaboração de estratégias que conduzirão a política climática no Brasil.

Nesse sentido, a secretária Nacional de Mudança do Clima, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Ana Toni, apresentou os esforços do Governo Federal em reunir informações, as demandas de cada bioma brasileiro e as estratégias de preservação e de recuperação do meio ambiente que serão incorporados ao Plano Clima.

“As causas da mudança do clima são muito variadas. Elas vêm, logicamente, de transportes, dos combustíveis fósseis, vêm da indústria e da poluição, vêm da agricultura e da falta de cuidado que nós temos com as florestas, vêm do desmatamento. No caso brasileiro, a maioria das nossas emissões tem vindo da mudança de uso da terra, principalmente de desmatamento”, avalia a secretária, que lembra que, desde o início do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula Silva, cerca de 50% do desmatamento na Amazônia foi combatido, reduzindo a emissão para a atmosfera de 250 milhões de toneladas de gás que causam o efeito estufa.

“Então, nós estamos trabalhando em sete planos setoriais de mitigação desses efeitos dos setores que mais emitem gases de efeito estufa. Estamos trabalhando em conjunto com os ministérios para que a gente desenvolva planos específicos, para que cada um desses setores possa diminuir a poluição que estão levando para a atmosfera”, acrescentou a secretária.

As ações são urgentes, não há dúvidas. Prova disso foi a ausência, na plenária de Porto Alegre, do ministro Márcio Macêdo, da Secretaria-Geral da Presidência da República, e da ministra Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Ambos estavam em Brasília, após uma convocação do presidente Lula justamente para debater as questões climáticas.

“A ministra Marina, o ministro Márcio e outros ministros estão sob convocação e também de prontidão em relação a essa situação de emergência que está afligindo todo o nosso país, especialmente no que diz respeito a essa causada pelos incêndios, pelo fogo, por várias situações criminosas que nós estamos enfrentando, que nos colocam numa situação dramática do ponto de vista, não só do nosso país, mas também da América do Sul. Esse tema foi objeto de discussões muito intensas, aqui, durante todo o dia, no Palácio do Planalto e que, agora, ainda se desdobram nessa parte da noite”, esclareceu Kelli Mafort, secretária Nacional de Diálogos Sociais, da Secretaria-Geral da Presidência da República.

DIREITO À PARTICIPAÇÃO – O direito a ser ouvido e participar das decisões que envolvem as políticas de combate às mudanças climáticas esteve entre as demandas dos representantes da sociedade civil, dos movimentos sociais e ambientalistas que participaram da escuta.

E esse é mesmo o objetivo da plenária realizada em Porto Alegre, como lembrou a secretária Nacional de Mudança do Clima do MMA, Ana Toni. “A gente tem trabalhado de uma maneira participativa. Então, a plataforma Brasil Participativo e esta reunião, como em outros biomas, é uma peça fundamental. Vai ter a Conferência Nacional de Mudança do Clima, a gente tem feito consultas com o setor privado, com os cientistas, com os governos subnacionais, com o Conselho da Federação, com os estados e municípios. Então, é onde a gente vê que vai ter um Plano Nacional.”

Renata Padilha, por exemplo, do Movimento Eco pelo Clima, falou em nome dos movimentos socioambientalistas e da juventude. Ela defendeu a criação de um Conselho Local de Juventudes pelo Clima e Meio Ambiente, de cunho deliberativo e propositivo no Plano Clima, para apresentar diversas recomendações e ampliar a participação pública de jovens representantes para que tenham espaço formal de influência nas políticas climáticas.

Quem sofre o impacto agora serão os que levarão a discussão para o futuro. “No nosso estado, as crianças têm medo da chuva. Mal dormem pensando que, a qualquer momento, elas podem ter que acordar, porque está chovendo muito, e terem que encontrar um abrigo para se salvar”, relata Renata.

ORDENAMENTO TERRITORIAL – Outra proposta defendida foi o direito à demarcação de terras, o direito a manter povos originários que usam a natureza de forma sustentável e com sabedoria em seus locais de origem. “A demarcação de terras indígenas é urgente. E também trazer essa questão da relação dos povos indígenas com essa terra. Acho que não somente é uma relação, digamos que, de posse, mas essa relação, a gente entende, como uma extensão do nosso corpo. A terra indígena, as terras, na verdade, o meio ambiente, como se fosse um ambiente inteiro, mas não só o meio”, define Laércio Karai, representante dos movimentos de povos indígenas do Rio Grande do Sul.

Mesma opinião tem Vera Beatriz Soares, do Fórum de Participação Social, que falou em nome dos movimentos de igualdade racial, dos quilombolas e dos povos de religiões de matriz africana. “É preciso manter o povo no seu lugar, porque em terra que tem seu povo existe defesa. Vamos manter o povo no seu devido lugar, acreditar na sabedoria natural de antes, quando ainda não existiam as universidades. Vamos manter os nossos quilombolas que trabalham no campo, na agricultura. Na terra que está ociosa, está lá o capitalismo, está lá aquele que não nos respeita”, defendeu.

“A gente tem, hoje, movimentos sociais que existem para lutar pelo território, pela terra. A gente tem uma realidade, hoje, que a gente continua tendo que enfrentar o lucro do agronegócio, o lucro da mineração, o lucro da energia, dos grandes setores que exploram, seja no urbano, seja no rural, o tema. Então, o que gente está trazendo para a discussão é conseguir que a soberania fundiária, a autonomia fundiária seja ponto primordial no investimento do Fundo do Meio Ambiente e do Fundo do Clima, garantindo que a demarcação de terras indígenas, a titulação de territórios quilombolas, a regularização de territórios tradicionais, a reforma agrária, a reforma urbana, sejam prioridade dos investimentos desses investimentos”, acrescentou Fernando Campos Costa, do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST).

MODELO ECONÔMICO – A progressiva introdução e expansão das monoculturas e das pastagens com espécies exóticas levam a uma rápida degradação e descaracterização das paisagens naturais do Pampa. A perda de biodiversidade compromete o potencial de desenvolvimento sustentável da região, o controle da erosão do solo e o sequestro de carbono que atenua as mudanças climáticas.

A destruição da vegetação nativa prejudica a absorção adequada das chuvas pelo solo, o que, por consequência, aumenta o escorrimento superficial das águas e favorece o acúmulo de água nos rios, causando enchentes.

Por isso, o modelo de exploração econômica típico deste bioma e a expansão do agronegócio também foram temas presentes no debate. Heverton Lacerda, da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, levou o pleito dos movimentos ecologistas. Ele reforça que entidades que visam apenas os interesses corporativos e econômicos têm provocado a degradação no Rio Grande do Sul “há tempos”.

Por isso, segundo ele, é preciso discutir como proteger o Pampa e, consequentemente, como garantir a qualidade de vida do ser humano. “O agronegócio, este modelo destrutivo (existem os responsáveis) está destruindo o Pampa, está destruindo os nossos biomas. Nós, dos movimentos sociais e ambientais, temos que entender que, neste tripé, o ecológico precisa estar em cima de todos, porque, só com o planeta preservado, com os nossos biomas, com os nossos recursos hídricos preservados, nós podemos pensar no social, e depois, podemos pensar também na importância do econômico”, acredita Lacerda.

“Precisamos romper com essas políticas que favorecem o agronegócio, enquanto lucram à custa das nossas florestas e do nosso pulmão”, protestou Cíntia Barenho, da Marcha Mundial de Mulheres.

Taxar as indústrias poluidoras, criar fundos de apoio a outras cadeias produtivas que usem energia limpa, energia verde, energia que seja renovável para alcançar um desenvolvimento mais sustentável do ponto de vista ecológico e ambiental foi umas das propostas de Dary Beck Filho, vice-presidente da Central Única dos Trabalhadores, que falou em nome de todas as centrais sindicais que participam do Fórum de Participação Popular. “Esse dinheiro tem que ir para o processo de criação de políticas, de tecnologia, de gestão mais limpa do processo do agronegócio.”

APOIO AOS ATINGIDOS – Amparar quem foi vitimado diante de tragédias climáticas também foi uma das demandas apresentadas na plenária. Alexânia Rossato, militante do Movimento dos Atingidos por Barragens, sugere a criação de uma política de segurança e de um auxílio financeiro para as populações atingidas por desastres ambientais. “O movimento propõe a criação de um sistema de proteção e segurança das populações atingidas, que deve incluir o mapeamento e o monitoramento da situação de risco, garantindo informações suficientes, adequadas e confiáveis, no momento e local apropriados, para orientar os procedimentos de defesa em situação de urgência, garantindo a evacuação e a proteção das famílias nas sedes urbanas e áreas rurais em risco, sem perdas de vidas e pertences”, propôs.

A oferta de condições físicas e de infraestrutura que evitem a perda do trabalho dos profissionais que recolhem materiais recicláveis foi a necessidade apresentada por Paulo Guarnieri, da Associação de Ajuda Mútua a Voluntários da Ecologia, e que falou em nome dos movimentos de catadores e catadoras de materiais recicláveis.

“Nossa proposta traz investimentos na construção e ou reforma de galpões e equipamentos urbanos para catadores de recicláveis sensíveis aos impactos da mudança climática por infraestrutura deficiente e pelo déficit de equipamentos locais de trabalho. No sistema informal, mais de 30 galpões foram impactados pela enchente. Estes, com estrutura deficiente, tiveram casos de perda total das instalações, equipamentos e veículos coletores. Essa foi a realidade”, lamentou.

AÇÕES FEDERAIS — O Governo Federal trabalha na construção do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento (PPCD) do Pampa, que deve ser concluído ainda neste ano. Como etapa de elaboração do plano, em abril foi realizado o I Seminário Técnico-Científico das Causas e Consequências da Supressão da Vegetação Nativa no Pampa, em Porto Alegre (RS).

PARTICIPAÇÃO SOCIAL — Mais de 20,4 mil participantes interagiram com o processo do Plano Clima no site do Brasil Participativo. Ao todo, até 13 de setembro, foram 1.133 propostas, com 1.930 comentários e 41.766 votos.

Por meio da ferramenta, cidadãs e cidadãos puderam cadastrar suas ideias respondendo à pergunta “Como o Brasil pode enfrentar as mudanças climáticas e reduzir seus impactos?”, além de votar e comentar as contribuições enviadas por outros participantes. O prazo para a participação foi encerrado até 17 de setembro.

Qualquer pessoa com CPF pôde apresentar três propostas e votar em até 10 de outros participantes, inclusive das plenárias. As 10 propostas mais votadas de cada um dos 18 temas definidos pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima poderão ou não ser incorporadas ao texto após análise do Governo Federal.

A participação social no Governo Federal é atribuição da Secretaria-Geral da Presidência da República. O modelo usado para o Plano Clima é o mesmo do PPA Participativo (Plano Plurianual 2024-2027) realizado no ano passado. Com metodologia de participação presencial e digital, o processo resultou na maior participação social da história do Governo Federal.

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PLANO CLIMA — A última fase de elaboração do Plano Clima será em 2025, com a formulação de planos setoriais e a realização da 5ª Conferência Nacional de Meio Ambiente e Mudança do Clima em maio. A partir do texto, o Governo Federal deve propor outras mudanças na legislação ambiental do país.

Todo o processo de formulação de instrumentos da Política Nacional sobre Mudança do Clima, com participação direta da população, será apresentado na 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), que acontece no Brasil, em Belém (PA), em novembro de 2025.

Fonte: Em Porto Alegre (RS), debate sobre o Pampa encerra o ciclo de plenárias do Plano Clima Participativo — Secretaria de Comunicação Social (www.gov.br)

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