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Com informação: gazetadigital
Nos últimos dez anos, os afastamentos do trabalho por questões de saúde mental mais que dobraram no Brasil, saltando de 221.721 casos em 2014 para 472.328 em 2024. Em Mato Grosso, o cenário acompanha essa tendência preocupante: no ano passado, dos 64.802 benefícios por incapacidade temporária concedidos, 4.362 estavam relacionados a transtornos mentais – sendo 2.486 por ansiedade e depressão, que figuram como a 10ª causa mais frequente de afastamento no estado, atrás apenas de problemas físicos como dores na coluna e fraturas.
O trabalho como fator de adoecimento
Maria Aparecida Campos, doutora em Psicologia Social e do Trabalho pela USP e professora da UFMT, explica que o ambiente profissional tem papel central nessa equação. “Metas abusivas, prazos irreais, gestão rígida e a cultura da autoexploração criam um terreno fértil para o sofrimento psíquico”, analisa. A especialista destaca que quando o trabalhador não encontra significado em suas atividades, sente-se desvalorizado ou impossibilitado de usar suas habilidades, abre-se caminho para o adoecimento.
Os números revelam apenas parte do problema. Como os dados do Ministério da Previdência não detalham a distribuição por municípios, não é possível identificar as regiões mais críticas de Mato Grosso. Contudo, a psicóloga ressalta que o fenmeno é amplificado por fatores externos ao trabalho: “A aceleração das mudanças climáticas, tecnológicas e sociais, somada aos impactos pós-pandemia, deixou as pessoas sem tempo para se adaptar. Isso se reflete no aumento de casos de ansiedade e depressão”.
Novos tempos, velhos problemas
A recente atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que passa a valer em maio em todo o país, tenta frear essa epidemia silenciosa ao obrigar as empresas a implementarem políticas de atenção à saúde mental. Mas para Campos, a solução exige mais do que cumprimento de normas: “Precisamos reconstruir uma cultura organizacional baseada na cooperação, não na competição. Dar voz aos trabalhadores e respeitar seus limites são passos essenciais”.
Enquanto isso, milhares de trabalhadores mato-grossenses seguem enfrentando o dilema entre produtividade e bem-estar. Os 1.283 afastamentos por transtornos ansiosos em 2024 – número que não inclui os casos não notificados ou tratados sem afastamento – mostram que o preço da pressão por resultados está sendo pago com a saúde mental da população. Como alerta a especialista, “humanizar o trabalho não é benefício, é necessidade urgente”. A questão que permanece é quantos casos ainda serão necessários para que essa mensagem seja realmente ouvida.